O Brasil vem apresentando uma regressão preocupante em termos de direitos humanos nos últimos anos. A pandemia do Covid-19 aprofundou de forma mais drástica as desigualdades sociais já existentes, levando muitos à pobreza extrema. Além disso, comunidades marginalizadas, incluindo-se as populações indígenas existentes no país, estão sendo hostilizadas pelo governo atual, enquanto regulações ambientais ineficazes e fiscalizações deficientes permitem que indústrias extrativas, principalmente de mineração, ameacem alguns dos ecossistemas mais vitais do mundo.
“Nós estamos vivenciando o desmantelamento do sistema de direitos humanos, especialmente nos últimos quatro anos,”, informou o irmão Rodrigo Péret, um frade do Brasil que vem frequentemente levantando essas questões perante as Nações Unidas. “Nós estamos nos opondo à essas práticas. Contudo, para obter sucesso nós precisamos de uma resposta coletiva – incluindo-se da comunidade internacional.”
A Franciscans International visitou recentemente o Brasil, antes de uma eleição presidencial crucial em outubro, e da futura avaliação do histórico de direitos humanos do país sob a Revisão Periódica Universal* (RPU). Durante essa missão, a FI visitou diversos projetos patrocinados pelos franciscanos, onde irmãos e irmãs proporcionam cuidados diretos às pessoas necessitadas, com o propósito de melhor entender os desafios que enfrentam.
Projetos locais dos franciscanos que ajudam diretamente comunidades afetadas
No Brasil, os franciscanos trabalham em diversos projetos que buscam melhorar as garantias fundamentais de comunidades locais e marginalizadas, como é o caso do abrigo Casa de Assis em São Paulo, que recebe migrantes e refugiados. Outros franciscanos trabalham com as autoridades locais por meio de centros móveis que oferecem apoio e assistência jurídica a migrantes vulneráveis. Embora o número total de migrantes tenha temporariamente diminuído no auge da pandemia, outras questões, como discriminação e trabalho forçado, surgiram.
Agora que as restrições de viagem foram suspensas, os franciscanos estão novamente vendo um novo influxo de migrantes – tanto de países vizinhos quanto da África e da China. Todavia, como o processo de regularização de migrantes praticamente parou por causa da pandemia do Covid-19, esses indivíduos estão enfrentando longos atrasos na formalização de seu status.
A pandemia também exacerbou muitas das desigualdades sociais profundamente enraizadas no Brasil, visto que o número de pessoas que passam fome, sofrem com a falta de moradia e a escassez de água, disparou. Os franciscanos responderam de várias maneiras: alguns distribuem alimentos diretamente à esses indivíduos; em Uberlândia, outros apoiaram a criação de cozinhas comunitárias que alimentam centenas de pessoas todos os dias; ainda há os que fornecem abrigo para aqueles que foram despejados durante a pandemia. Contudo, esse trabalho lida mais com as dificuldades imediatas – é necessário o envolvimento ativo das autoridades para melhorar estruturalmente a situação.
As indústrias extrativas, por outro lado, prosperaram durante a pandemia. A mineração foi declarada uma “atividade essencial”, permitindo que projetos avancem e continuem a ameaçar tanto as comunidades locais quanto os ecossistemas vitais. Muitas vezes, essas operações também infringem as terras indígenas, sem o consentimento da população diretamente afetada.
Os perigos trazidos por essas práticas podem ser exemplificados pelos desastres ocorridos em Mariana, em 2015, e, quatro anos depois, em Brumadinho, onde o rompimento de uma barragem de rejeitos causou centenas de mortes e danos ambientais generalizados. Anos depois, as vítimas ainda sofrem com os danos residuais da poluição e do lixo tóxico, e muitos não receberam indenizações apropriadas.
A mudança climática está exacerbando mais ainda o problema, à medida em que chuvas e tempestades cada vez mais fortes espalham a poluição por uma área ainda maior. “No Brasil, a mineração não esgota apenas a terra. A destruição que traz também esgota as pessoas.”, afirmou o irmão Rodrigo, que trabalha em estreita colaboração com as comunidades afetadas.
Usando os mecanismos das Nações Unidas para aumentar a pressão sobre o governo
Além desses projetos, os franciscanos também buscam a comunidade internacional para ajudar a melhorar a situação relativa aos direitos humanos no Brasil. Em agosto, imediatamente após a visita da FI, o irmão Rodrigo viajou para Genebra, onde levantou as preocupações dos franciscanos, e aliados, perante uma ampla gama de missões diplomáticas, em uma pré-sessão antes da RPU do Brasil; bem como se reuniu com vários especialistas da ONU em direitos humanos.
Em decorrência desse trabalho em advocacia, a FI e os seus parceiros submeteram um relatório conjunto à ONU, o qual detalha uma ampla gama de preocupações relacionadas à situação dos direitos humanos no país. Durante a pré-sessão da RPU com as missões diplomáticas em Genebra, o irmão Rodrigo também fez uma recomendação específica para garantir que os direitos das vítimas sejam protegidos, bem como para acabar com a impunidade prevalecente que permite que as empresas evitem a responsabilização pelas violações de direitos humanos causadas por suas atividades.
“Essas recomendações são extremamente importantes, pois servirão como a base de um roteiro para o novo governo”, asseverou o irmão Rodrigo. “Elas também nos darão as ferramentas necessárias para pressionar e melhorar a situação dos direitos humanos no Brasil.”
Um mapa mostrando todos os conflitos relacionados às atividades de mineração no Brasil